Explicando O Modelo De Família Patriarcal

Explicando O Modelo De Família Patriarcal

O chamado modelo patriarcal de família tem referência com o modelo senhorial e os clãs parentais. Quando pensamos em modelo patriarcal, pensamos de imediato em um tipo de estrutura familiar extensa, ou seja, é um conceito de família que abriga em seu seio todos os agregados.

Na definição da família patriarcal temos uma família numerosa, composta não só do núcleo conjugal e de seus filhos, mas incluindo um grande número de criados, parentes, agregados e escravos, submetidos todos ao poder absoluto do chefe do clã, que era, ao mesmo tempo, marido, pai, patriarca. O termo patriarcal, designa a prática desse modelo como forma de vida própria ao patriarca, seus familiares e seus agregados.

Nele, o pater seria o chefe (ou, autoridade maior) do grupo familiar. Logo, não se restringe apenas ao núcleo familiar pai, mãe e filhos, mas faz referência a todos os que giram em torno do núcleo centralizador dos vários tipos de relações: o patriarca. Dessa forma, o patriarca constitui-se em um núcleo econômico e um núcleo de poder.

Como núcleo econômico, vemos que o patriarca tem um extenso número de agregados, criados, escravos, etc. que dependem dele como provedor. Percebe-se que, neste modelo de sociedade, as relações econômicas contornam a figura do chefe – do pater – este, muitas vezes, era um senhor de engenho.

Como núcleo de poder destaca-se o fato de todos os seus agregados estarem subordinados a sua autoridade; é o pater, quase que na totalidade das vezes, quem decide o destino de seus agregados (sem nos esquecer dos outros núcleos de poder que atuam em conjunto com o patriarca, e que muitas vezes também está subordinado a ele: aí incluímos autoridades religiosas, jurídicas e políticas).

O modelo patriarcal pressupõe, segundo a historiografia, algumas premissas como:

1) a visão de uma sociedade dividida entre senhores e escravos (dominantes e dominados). Este conceito analítico seria definido principalmente por correntes historiográficas de tendências marxistas.

2) A escravidão teria desvirtuado o comportamento familiar do modelo ibérico.

3) A família brasileira seria uma adaptação ao sistema colonial, ou seja, resultado de um processo singular de criação de um determinado tipo de estrutura social.

Essa visão, proposta sobretudo no terceiro ponto, naturalizou historicamente o modelo patriarcal. Nas discussões a respeito do tema, durante a década de vinte (quando estava em voga o processo de modernização das estruturas de produção e de comportamentos, sobretudo em Recife), cujo principal articulista foi Gilberto Freyre, no Diário de Pernambuco – jornal em que publicou diversos artigos ao longo dessa década -, a campanha regionalista e tradicionalista encamparia esta bandeira ao pressupor que a sedução ao moderno desenraizaria as tradições familiares do ser original do Nordeste.

O processo de colonização no Brasil deu-se sobre a égide de um tripé fundamental estruturado da sociedade brasileira. Seriam estas as bases: o latifúndio, a escravidão e uma economia agro-exportadora. A família senhorial era a resultante desse tripé, segundo a formulação freyreana. É como se este tripé fundador da sociedade colonial tivesse resultado, necessariamente, no modelo patriarcal de família. Provém desta visão o resultado de alguns trabalhos posteriores de intelectuais como Oliveira Viana e Alcântara Machado, que generalizaram o conceito freyreano, estendendo-o para todo o resto do território brasileiro através da fórmula família brasileira = família patriarcal.

A estrutura desse modelo foi elaborada teoricamente por Gilberto Freyre, e reproduzida dentro da historiografia subseqüente aos principais trabalhos de Freyre (Sobrados e Mocambos e Casa-Grande e Senzala). Autores como Sérgio Buarque de Holanda, Caio Prado Jr. e Antônio Cândido são alguns dos exemplos dentro da historiografia brasileira que se utilizaram desse conceito elaborado por Freyre.

Atualmente, muitas críticas e releituras desse modelo são realizadas. Alguns até buscam anular sua existência e viabilidade, afirmando que não seria condizente com a realidade brasileira (principalmente a realidade do Sul e Sudeste). É bom observar que Freyre analisou, com primazia, os modelos de família no nordeste, sobretudo em Pernambuco, e que parte significativa da historiografia brasileira buscou, de forma generalizante, reproduzir esse modelo para todo o país. Esse não era uma pretensão de Freyre, e, como eu disse, tem mais a ver com sua reprodução pouco cuidadosa do que com a obra do próprio Freyre.

Por sua vez, é também necessário dizer que este conceito, como qualquer outro conceito nas Ciências Humanas, não existe como um dado na natureza, ou seja, ele também foi construído ao longo do tempo, possuindo data e local de invenção. Um dos papéis do Economista Doméstico, acredito, é o de quebrar com essas naturalizações dos conceitos, mostrar como foram criados e com quais propósitos, suas aplicabilidades e problemas, suas restrições e funções. Nesse sentido, é tão necessário fazer uma história dos conceitos e dos processos, que de grandes homens e heróis.

Segundo Ângela Mendes de Almeida, em seu texto Notas sobre a família no Brasil, “Freyre foi o inventor do conceito de família patriarcal, para descrever as relações familiares no Brasil, desde o período colonial até o final do século XIX, quando esta teria entrado em declínio, para ser substituída, paulatinamente, pela família nuclear burguesa”.

Indicações de leitura:

• Ângela Mendes de Almeida – Notas sobre a família no Brasil. In: Pensando a família no Brasil (Seminário).

• Gilberto Freyre – Casa Grande & Senzala.

• Gilberto Freyre – Sobrados e Mocambos.

• Sérgio Buarque de Holanda – Raízes do Brasil.